Pessoas de Bem (não estão no) e o governo de Bolsonaro

por Fabiano da Costa*

Imagem: Nocaute

Pessoas de Bem

“A gente já percebeu que não adiantou o vazamento dos diálogos entre Sergio Moro e Deltan Dallagnol. Como não adiantou nada quando pegaram o Dallagnol comprando apartamentos do “Minha Casa Minha vida” para especulação imobiliária.

A turma dos Bolsomitos entrou defendendo o Promotor e o defendeu mesmo quando ele, ruborizado, decidiu devolver os apartamentos.
Não adiantou nem mesmo os números do IBGE: O desemprego aumentou no Governo Bolsonaro e chegamos à marca, recorde, de 43 milhões de pessoas sem renda. No mesmo dia em que o IBGE publicou este alarmante dado, o que eu mais vi foi gente dizendo “Bolsonaro está arrumando o país e o IBGE está cheio de comunistas“.

E por que não adiantou?

Estamos lidando com uma mutação social, construída entre a Biologia e a Sociologia, que mistura o mais baixo grau de inteligência com um nível desmedido de mau caratismo. Gente que afirma categoricamente que juiz (o que realiza julgamento) pode ter lado, pode sentar frente às partes já com a sentença na cabeça, por encomenda, não só não entende o que é justiça, mas também não tem limites para alcançar o que deseja.

Sua confusão entre Justiça e Revanche é natural, por que para ela, certo é o que lhe convém.

Não sei se estou sendo bem claro, mas estou dizendo que estamos lidando com pessoas sem limite ético (o que é pior que estar sem limitação moral).

Existe gente assim no PT? Existe. Existe também no PSOL, existe no PCdoB, no PCB, nas igrejas e clubes de futebol, e em todos os cantos, mas foi e é em Bolsonaro, Moro, PSL e seus compadres, que eles melhor se encontram.

Por quê?

Por que a Extrema Direita é constituída justamente pela falta de limites e o descompromisso com o respeito e os Direitos Humanos. A Extrema Direita se construiu historicamente nas bases do frenesi, do fanatismo e no horror das Massas que se repetiam nos séculos anteriores.

As chamadas “Pessoas de Bem“, que assim se auto-intitulam, reservam a si mesmas o alto posto da mais alta correção. E para fazer cumprir esta suposta correção, recorrem à interpretações doentias: são contra o estupro, mas vibram quando sabem que o acusado de estupro será violentado em uma cadeia suja. São contra a violência, mas querem portar armas para aumentar o nível de violência e matar quando acharem necessário.

Assim, são também contra a violência no trânsito, mas acham que crianças devem andar desprotegidas no carro.

Para quem se acha “pessoa de bem“, não existe racionalidade e julgamento ético: Existe sim a sua moral, que sempre lhe convém no momento certo. Pessoas de bem são bedéis e juízes ao mesmo tempo, mas nunca serão réus. Na sua cabeça maluca, deus opera por todo o tempo, mas somente pelo bem delas.

Estou desenhando este quadro medonho, apavorante, por que além de artista, sou professor de História na Rede pública e lecionando, eu tenho a capacidade de compreender como esta gente perambula pelos mais tenebrosos períodos: linchando judeus no Período da Peste Negra (1342); empalando muçulmanos na Cruzadas no Século 13; realizando os Pogrons do Czarismo no Século 19; defendendo o Darwinismo Social e deixando os desempregados morrerem de fome durante a Segunda Revolução Industrial, também no Século 19…

É só imaginar aquela histeria coletiva, quando falando em nome de Cristo, esta mesma gente, amontoada, vibrava com uma suposta bruxa tendo sua língua arrancada em praça pública.

Resumindo: Pessoas de bem defendem todo o mal necessário, por que na cabeça delas, o vale tudo é constante: As milícias de São Domingos; as Cruzadas; a Inquisição…

Nos próximos dias, o site The Intercept divulgará mais e mais conteúdo das entranhas da Operação Lava Jato. Gente como eu (que não é pessoa de bem), já sabe tudo o que se esconde nos muquifos destes diálogos.

Desde que Sergio Moro começou a cortar cabeças em 2014 e apareceu sua biografia, ficou muito claro para quem este espetáculo seria oferecido: quem era platéia e quem seria enforcado.

Assim, não devemos esperar muito de reação popular, por que as pessoas de bem estão convictas de que aconteça o mal que acontecer, isto será sempre pelo bem delas. Tenhamos em mente o momento em que Joana Darc foi queimada pelos católicos ingleses em 1431: enquanto o cheiro de carne queimada, tal qual um churrasco, invadia a cidade, alguns voltavam sorridentes por que haviam feito o que era certo.

No futuro, quando lerem sobre o Brasil de hoje, sentirão o mesmo que tu sentiste ao ler isto: uma incompreensão total de como pode haver tanta crueldade.

Mas não nos assustemos: Pessoas de bem vem e vão na história, mas graças a Deus, não ficam sempre.”

Fabiano da Costa é professor de História

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