Ex-presidente convocou a população para a ação por soberania, emprego e desenvolvimento social
“Antes e depois do PT o papel do Estado foi e é apenas pensar em resolver problemas do sistema financeiro e nada na área social. Não existe nada sobre geração de empregos e desenvolvimento social”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante o seminário “Reconstruir e Transformar o Brasil”, promovido nesta segunda-feira (19) pela Fundação Perseu Abramo (FPA) e pelo PT.
Lula encerrou o seminário após exposição da ex-presidenta Dilma Rousseff. Dilma denunciou os governos pós-golpe por promoverem às escondidas, mas de forma “precisa”, a desnacionalização da Petrobras e do pré-sal, que considera patrimônios indispensáveis à soberania nacional.
Lula fez duras críticas à ausência de projetos, ao falso nacionalismo dos grupos que estão no poder e também à falta de ação dos que assistem calados.
“Essa gente não está preocupada com o Brasil nem com o povo brasileiro. O Bolsonaro disse que está contra a Lava Jato porque não tem corrupção no governo. Não tem, porque ela [a corrupção] está dentro da casa dele. São os três filhos. A imprensa fala. Não é o Lula que está falando. Está na mão do Queiroz. Por que ficamos pacíficos? Ordeiros? Quietos?”, provocou.
O objetivo do encontro que durou mais de quatro horas foi discutir o plano apresentado pelo partido para tirar o país das crises política, econômica e sanitária.
“Temos de chamar a população para discutir os problemas do Brasil. Não é possível, não existe solução se o povo não assumir a responsabilidade. O povo não pode continuar votando em um Congresso de extrema direita, como temos hoje, e depois esperar mudanças em benefício do povo”, afirmou.
Hora do levante
Lula disse estar disposto e que “vai viver muito, enquanto houver luta em defesa do povo brasileiro”. “Vamos suportar até quando? Até quando vamos chorar? Até quando vamos lamentar o desemprego? Só sabe o que é desemprego quem está desempregado. Os concursados da elite do setor público não sabem o que é um pai de família não ter o que levar pra casa no final do dia”, completou.
Em um chamado à ação, o ex-presidente cobrou coragem de todos os cidadãos. “Não existe possibilidade de vencer esses milicianos que estão no comando se não tivermos coragem. Essa gente não é novidade. Eles já existiam. Gente que tinha vergonha de dizer que era malufista, defensor da ditadura. Bolsonaro deu cidadania para essas pessoas virarem o que viraram. Como se liberasse os demônios dentro das pessoas. Com ofensa, violência, descrédito, desrespeito.”
Contra o entreguismo
Para Lula, o que está — e sempre esteve– em jogo, é a soberania dos povos da América Latina, a autonomia e liberdade, em oposição à servidão cega aos Estados Unidos, como defende Bolsonaro.
“Política de inclusão social é uma coisa que já derrubou muitos governantes na América Latina. Agora, com a loucura de um presidente como o Donald Trump nos Estados Unidos, ele resolveu consolidar a América Latina como seu quintal. Como um lugar insignificante. Um lugar em que seu secretário de Estado vem para Roraima ameaçar um vizinho de golpe, utilizando militares brasileiros. Militares que deveriam estar apagando fogo na Amazônia”, disse.
A crise econômica, argumenta o ex-presidente, possui ligação justamente com a situação de cidadão de segunda classe que comanda parte da elite brasileira e dos grupos que estão no poder. “Nós exportávamos etanol, e agora importamos etanol de milho dos EUA. Uma subserviência nunca antes vista no Brasil. De uma elite que é um bando de vira-lata na relação com os Estados Unidos. Não se respeitam e ninguém respeita quem não se respeita.”
Questão de narrativa
Esse lugar menor que o Brasil ocupa “nas mentes da elite do atraso” conta com aprovação popular por narrativas forçadas. “Estamos há 15 anos ouvindo e assistindo a narrativas contra o PT. Praticamente narrativas de destruição de tudo que foi construído para conquistarmos cidadania para o povo brasileiro. Todo santo dia há construção de uma história nas televisões e jornais de que é preciso privatizar, permitir entrada do capital estrangeiro em empresas públicas, é preciso vender banco público, Petrobras, Eletrobrás. Tudo isso em nome da recuperação de uma economia que eles destruíram”, disse Lula.
“Não conheço um produtor de galinha que produziu mais colocando a raposa no galinheiro. As transformações que precisamos fazer fazem parte de uma narrativa de qual político queremos eleger. Para destruir o PT e os setores progressistas, construíram uma narrativa. Começaram a vender a ideia de que a Petrobras era corrupta e que para acabar com a corrupção, tínhamos que entregar o pré-sal, nossas refinarias, nossas distribuidoras, nossas tecnologias”, completou, ao citar o desmonte das políticas nacionais de petróleo e gás, colocado à todo vapor após o golpe de 2016.
Dilma: Petrobras, pré-sal e soberania
A ex-presidente Dilma Rousseff falou de forma mais detalhada sobre os projetos de soberania derrubados pelo golpe de 2016 e desconstruídos totalmente durante o governo do presidente Jair Bolsonaro. Entre eles, Dilma enfatizou a entrega da riqueza do pré-sal a empresas estrageiras.
“Tínhamos uma proposta de política industrial que tinha um elemento fundamental que era a cadeia de petróleo e gás. Sobretudo, porque o Brasil tinha descoberto durante o governo Lula as grandes reservas do pré-sal”, disse Dilma.
A ex-presidenta destacou o desmonte do setor essencial para o país, visto como estratégico para um desenvolvimento nacional. “Existia a convicção de que o pré-sal era fundamental para a projeção do Brasil e para o desenvolvimento econômico e social do nosso povo”, disse. Para Dilma, o pré-sal deveria ser considerado uma riqueza grande como a pátria”, disse.
“Então, a Petrobras foi colocada como detentora de 30% de todos os blocos do pré-sal (…) Agora, a Petrobras não tem mais os 30%. Ela participou, em dois leilões, de 2016 e 2020. De 24 blocos vendidos, levou cinco. Empresas estrangeiras arremataram 19. A Petrobras que está sendo desnacionalizada e esquartejada. As grandes empresas internacionais de petróleo, como Chevron, Shell, ExxonMobile, estão controlando o pré-sal”, completou Dilma.
Ela vê como estratégica e prioritária a defesa da Petrobras pública, alertando que uma das empresas mais importantes para a soberania nacional passa por uma política de desnacionalização feita às escondidas. “Os destinos da Petrobras sempre nos importaram porque ela é um gerente de soberania (…) Petróleo e aeronáutica são duas áreas que tínhamos domínio de tecnologia, diferencial”.
União e articulação
Dilma ainda destacou que a crise econômica que se abate sobre um país fragilizado em questões de soberania deve se estender. Isso, porque o mundo está distante de se recuperar da pandemia de covid-19, que agora entra em uma segunda onda de impacto, que deve frear as retomadas dos crescimentos dos países.
“Neste seminário, vimos propostas focadas na sobrevivência das pessoas (…) As perspectivas de retomada da economia, com a segunda onda, serão difíceis. Falo da retomada internacional. É muito difícil supor que não haja uma grande crise no Brasil. Estamos estacionando em níveis elevados de mortes, temos 14% das vítimas do mundo e apenas 2,8% da população. Isso significa crise de demanda pesada”, disse.
A ex-presidenta ainda destacou a necessidade da suspensão da Emenda Constitucional 95, que impôs teto de gastos à União. “Temos uma proposta de financiamento e de saída do teto de gastos. Temos a pavimentação de um caminho para onde trafegar”, concluiu, ao exaltar as ideias apresentadas durante todo o dia.
Trabalho estratégico
O deputado federal (PT-PR) e líder da bancada do PT na Câmara, Enio Verri, seguiu na defesa das propostas apresentadas e destacou que “o Partido dos Trabalhadores sempre teve um projeto. É fundamental termos algo atual, que entendeu a dinâmica das mudanças do capitalismo e do mundo em que vivemos. Neste sentido, este trabalho é fundamental e estratégico, olhando para o que queremos do Brasil”.
Enio destacou a ação coletiva dentro do PT para a realização do plano e do seminário. “Vejam que boa parte das apresentações de hoje tiveram como participantes um colega ou uma companheira deputada. Fizemos um relacionamento importante, a relação com a direção partidária, com a Fundação Perseu Abramo e trabalhamos de forma unitária. Temos conseguido avançar muito, seja na pauta política, seja no dia a dia.”
Ideias que se concretizam e ações, como destaca o deputado, que já norteiam a ação da bancada petista. “A verdade é que trabalhamos em projetos que estão caminhando. Trabalhamos para que os nossos projetos cheguem na Câmara dos Deputados. Vamos trabalhar para manter os R$ 600 do Auxílio Emergencial e também para derrubar os vetos à Lei Assis Carvalho; uma lei que trata da agricultura familiar. Uma lei que tem a cara do PT que foi vetada 80% pelo presidente Bolsonaro”, completou.
Fonte: Brasil de Fato