Lênin e o marxismo como prática revolucionária

por Jones Manoel

Foto: Reprodução da internet

Lembro que em 2014 assistia muitos vídeos do professor Sérgio Lessa. Num curso de introdução à ontologia marxista, Lessa desenvolve sua crítica ao “praticismo” (que, embora tenha elementos importantes, como a crítica do desprezo da teoria e do estudo, acaba caindo na defesa de um marxismo contemplativo e paralisado) e afirma que Lênin, quando eclodiu a Primeira Guerra, não correu para ação, foi estudar Hegel e só a partir do estudo de Hegel ele consegue refinar sua compreensão revolucionária de mundo. Lessa continua e afirma que, sem esse estudo de Hegel, é difícil compreender a virada teórico-político inscrita nas Teses de Abril.

Eu concordo com Lessa, mas discordo em um ponto importante: enquanto Lênin estava fora da Rússia estudando Hegel, milhares de militantes estavam construindo o partido, praticando política, atuando nos sindicatos, movimento estudantil, Forças Armadas; sendo presos, torturados e mortos. Quando Lênin volta para Rússia, sua voz só é ouvida porque existia um instrumento político de materialização das suas ideias, de ligação da teoria marxista com as massas: o partido revolucionário.

Lênin dedicou sua vida quase inteira a construir esse partido. Aliado a isso, sempre combateu as diversas tendências paralisantes do marxismo: seja o economicismo que dizia que a cabeça da revolução era da burguesia, por falta de condições objetivas; seja o fatalismo que anunciava que a revolução viria com o desenvolvimento inexorável do capitalismo ou as várias formas de idealismo marxista que achavam que a revolução seria fruto da mera divulgação da teoria marxista – a manutenção do velho espírito de círculo.

Antônio Gramsci chegou a escrever que a Revolução Russa foi uma “revolução contra O Capital” por negar as tendências economicistas de leitura de Marx e colocar o acento na ação política como mediação fundamental do fazer histórico. Florestan Fernandes destacou que Lênin foi o marxista que melhor compreendeu a autonomia relativa da política enquanto complexo social e sua capacidade, enquanto mediação revolucionária, de mudar as estruturas e correlações de forças. Carlos Nelson Coutinho, em O estruturalismo e a miséria da razão, afirma que Lênin foi o marxista que melhor compreendeu, na teoria e na prática, a mediação entre condições objetivas e subjetivas e sua síntese por meio da política.

O marxismo é prática revolucionária. As ideias marxistas só se tornam perigosas quando atingem as massas. Devemos sempre, é claro, buscar um marxismo crítico, dialético, refinado, mas é preciso saber que no processo de popularização e massificação desse marxismo, dadas as CONDIÇÕES OBJETIVAS do nosso povo, muito desse refino vai ser perdido – ou alguém acha que os trabalhadores da Rússia, China, Vietnã, Coreia e Cuba, para ficar apenas em alguns exemplos, liam a porra do Hegel e sabiam o que é ontologia do ser social? (parecem que esquecem que, nesses países, mais de 70% dos trabalhadores eram analfabetos!). O papel da vanguarda é estudar muito e pensar em formas de divulgar o marxismo o máximo possível e não achar que o trabalhador brasileiro vai ter que ler todos os volumes do Capital para fazer revolução!

Um marxismo sem prática política, sem intenção de prática política, sem intenção de popularização e massificação, é um marxismo de cátedra, castrado, domesticado e enjaulado. É uma espécie de reviver permanente do Seminário do Capital da USP.

Eu, como bom leninista que sou, compreendo que a missão do marxismo é ser um guia para ação – e pesquisa organicamente ligada a prática política – e uma arma viva na mão dos trabalhadores/as.

Quem não entendeu isso, recomendo não homenagear Lênin!

Fonte: publicado originalmente em Portal Disparada

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