por Mino Carta
O próximo governo vai realizar uma verdadeira revolução cultural para impor a lei do mais forte e um projeto que nega os valores da civilização
No país material e moralmente devastado pelos efeitos do golpe de 2016, Jair Bolsonaro prepara-se para exercer a Presidência da República. Há quem o defina como fascista ou nazista, de extrema-direita ou super-reacionário. Bolsonaro, entretanto, é tão único como será seu governo e o próprio Brasil. Qualquer comparação é impossível.
Estamos diante da exasperação de tudo quanto sofremos em dois anos e alguns meses, através de uma série de atentados à razão.
Os ricos se dão ares de contemporaneidade do mundo, e ignoram o miserável estado da sua incultura e da sua imoralidade, a maioria pobre não passa de uma grei incrédula e sempre amedrontada, pronta a dar seu aval não a um populismo rasteiro, e sim ao reinado da violência demente. Não há exemplo igual, ou mesmo parecido.
Valores e princípios da civilidade são sepultados com o apoio do exército de ocupação e o beneplácito do Judiciário que jogou ao lixo a Constituição e permitiu todos os desmandos praticados pelo estado de exceção, e até se antecipou ao futuro presidente pela boca de um certo Toffoli, capaz de revisar a história dos últimos 54 anos na definição do golpe de 1964, do qual resultou a ditadura, como “movimento”.
Ali está, no soturno palácio do Supremo o grupelho pomposo que se prontifica a legalizar a ilegalidade, embora ninguém seja tão representativo da injustiça comoSérgio Moro, ministro da Justiça dotado de plenos poderes para fiscalizar a vida de todos, o inquisidor de Curitiba em quem Luigi Ferrajoli identificou “a negação da imparcialidade”.
Só no Brasil o fenômeno Bolsonaro, primitivo, desvairado, delirante, seria possível. Leiam, na página ao lado, os pontos principais da ação do próximo governo e entendam por que se trata da proposta de uma verdadeira revolução cultural a colocar pobres contra pobres.
A mais falada revolução cultural do século passado, promovida por Mao Tsé-tung ao cabo da Longa Marcha, foi tão comentada a ponto de levar um enfant gâté de uma belle époque nova-iorquina a brindar o mundo da arte moderníssima com o retrato do líder chinês, realizado com a técnica de colorir ao acaso uma foto prismada. Andy Warhol inspira a capa da edição de CartaCapital desta semana.
Quanto à revolução, destinada a derramar cada vez mais sangue nas calçadas, ela assume propósitos mais largos. É a revolução que prega a lei do mais forte ao sabor do ódio desmotivado, o entreguismo amplo, geral e irrestrito, a repressão na mira do fuzil, a reedição da arcaica visão de que atrás de cada esquina agacha-se um comunista degustador de criancinhas.
Segundo o pensador do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, FHC é comunista e não vai faltar quem acredite. É a conclusão de um enredo de 518 anos, a moral de uma história excepcionalmente sombria, a infelicitar um país credenciado a ser potência mundial e enfim reduzido a escombros.
Neste momento, minha única esperança é que a razão nasça da loucura, algum dia que almejo próximo. No mais, aviso: cidadãs e cidadãos, vocês nunca verão terra igual à de Bolsonaro.
Fonte: Carta Capital