por Rui Daher
O movimento é peça-chave como reação aos interesses dos grandes empresários do agronegócio
Durante este trevoso ano de 2019 dediquei várias colunas em CartaCapital e no GGN alertando aos leitores prestarem mais atenção no importante trabalho que, através dos tempos, vem sendo feito pelo MST, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.
Estigmatizado, perseguido, pessimamente entendido pela sociedade brasileira que não vai aos campos e é informada somente pelas folhas e telas cotidianas, politicamente compradas pelos interesses da bancada rural no Congresso e as multinacionais ligadas ao agronegócio.
Em onze de dezembro aqui publiquei: “O papel do MST em um país onde 210 milhões têm o péssimo hábito de comer”. Acrescia uma frase-poética: “sempre apareceremos como um dos países onde mais grassa a desgraça da desigualdade”.
Eu termino 2019 nesta coluna, feliz em ver que mais jornalistas sérios começam a entender dinâmica e importância na inserção agrária, em feitos do MST.
Refiro-me a duas matérias que recomendo fortemente leitura e audiovisual, respectivamente.
A primeira foi realizada, em 23/12, pelo editor desta CartaCapital, Carlos Drummond, com título: “Bolsonaro age para sufocar agricultura familiar e pequenos produtores”.
Previ que isso aconteceria, muitas vezes num samba de uma nota só, quando, em 2016, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, criado no final de 1999, águas não petistas, foi extinto. Daí em diante, tornou-se massacre. Antes pelo inepto Michel Temer, agora por Tereza Cristina e o Regente Insano Primeiro.
Outra ação que me fez feliz veio de Luís Nassif, no GGN: A extraordinária tecnologia social do MST: entrevista com Milton Fornazieri. Fundamental.
Nos fará entender o motivo de a “pelada”, como assim assinou Mônica Bérgamo, na Folha de São Paulo, com Lula e Chico Buarque, Guararema, SP, Escola Florestan Fernandes, a jornalista sem perceber que lá estava representado o Brasil de necessitados, inclusive aqueles que perambulam na Rua Barão de Limeira (SP), poucos metros abaixo da Cracolândia, perto dos olhos da colunista.
O desânimo de um país desalentado chega-me logo. Edição de 23/12, do Valor, sucursal paulista do “Globo”. A matéria é de Rafael Walendorff. “Ruralistas preveem mais conquistas no Congresso em 2020”. No púlpito, Alceu Moreira, presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), no altar coroinhas ajoelhados em agradecimento. Se evangélicos forem, é só trocar de sinal a simbologia.
Vamulá: prazo indefinido para inscrição no CAR, Cadastro Ambiental Rural (e quem já fez, como fica?); posse de armas para proteger latifúndios de invasões; registro de agrotóxicos proibidos em outros países; imóveis em áreas de fronteiras ou indígenas regularizados; venda livre de terras a estrangeiros; fontes privadas de financiamento subsidiado.
Por que não? Vocês merecem, votaram maciçamente nos candidatos do PSL. Só que não? Racharam? Meio esquisito. Fragmentam-se como a esquerda. Lamentável.
Esperado. Associações, federações, confederações, porta-vozes da indústria de insumos e de tradings aprovam em 90% o desempenho do governo. Mas ainda querem mais. O que já está prometido para 2020.
Quem reclama e vê horizonte desfavorável?
Ambientalistas (desmatamento e incêndios amazônicos, por acaso, não aumentaram?); pequenos e médios agricultores classificados dentro da agricultura familiar, que não se veem contemplados pelas novas medidas; Incra, Funai e Ibama, sem poder decisório e subalternos às decisões ruralistas.
O fato de a AGU, Advocacia Geral da União, instrumentada ao mal, ser favorável a liberar a atividade rural na, mais do que ameaçada, Mata Atlântica, sem fiscalização, é ato criminoso.
Mandam no Brasil economistas neoliberais fósseis. Desatentos às tendências mundiais. A tendência mundial, até entre economistas e cientistas sociais conservadores, é de que o fortalecimento da democracia se dá pela diminuição da desigualdade. Mas não nesta Federação de Corporações. Aqui se governa dando muito a quem pouco precisa, e pouco para quem muito precisa.
Bem, leitores e leitoras, estarei sabático até a segunda semana de 2020. Espécie de cansaço com a burrice do ano que se vai.
Inté!
Fonte: publicado em Carta Capital