por Pedro Rossi
Pandemia impõe abandono da “fantasia” neoliberal. É mentira que o Estado não tem dinheiro
1. Primeiro é preciso largar o dogmatismo fiscal e rasgar a fantasia neoliberal. Temos que esquecer aquele papo de que não tem dinheiro, de que o Estado está falido. Porque isso é mito/mentira. Tem dinheiro.
2. Não há restrições financeiras para o gasto público, além das regras instituídas. O governo gasta, depois o Banco Central avalia a base monetária/meta de juros e recolhe dinheiro em troca de dívida. O governo não precisa de dinheiro prévio, nem de taxar pra depois gastar.
3. Não faz sentido achar que tem que tirar de alguém para poder gastar. Não precisa tirar do policial e do professor, não precisa cortar 25% do salário de funcionários públicos. Isso só vai atrapalhar a recuperação econômica no pós-crise sanitária. A PEC Emergencial é estúpida.
4. Quem ganha e quem perde? Qualquer gasto público é redistributivo. Se o Estado garantir renda para o mais pobres, dinheiro para a saúde e para que o sistema econômico não colapse, uns ganham mais do que outros. Mas, ao evitar um caos social, a sociedade como um todo sai ganhando.
5. O que vai acontecer se a dívida publica subir 10% do PIB, um caos social? Não, isso vai acontecer se o governo não gastar agora.
6. O aumento de dívida NÃO precisa ser revertido em seguida. Aliás, o padrão do comportamento das dívidas soberanas mostram: dívida pública não se paga, se rola. A tentativa de reduzir dívida em seguida da crise sanitária por meio de um forte ajuste fiscal seria trágica.
7. Além de rasgar a fantasia neoliberal, devemos largar os mitos cultivados pela esquerda. A dívida pública não é um problema moral. Não há limite mágico para a dívida pública. Dar calote na dívida em moeda nacional não faz nenhum sentido.
8. NÃO FAZ SENTIDO VENDER AS RESERVAS CAMBIAIS! Não precisa vender dólar para financiar gastos em reais, isso mantém a dívida líquida constante e aumenta a vulnerabilidade externa. Se for usar, que financie importação de medicamentos ou empresas endividadas em dólar.
9. Quem acha que serão dois meses de aumento de gastos e depois voltamos para austeridade fiscal, tá enganado. O custo social disso seria enorme. Dívida publica se estabiliza com crescimento. Enquanto houver desemprego e capacidade ociosa, a política fiscal pode ajudar.
10. Essa crise vai mudar paradigmas em termos de política fiscal. A realidade é tão chocante que as pessoas abandonam os dogmas. As ideias monetaristas foram por terra depois da crise de 2008/09. Agora é a vez definitiva dos dogmas fiscais.
Obs: Para o pessoal que aponta a Conta Única do Tesouro como nossa solução (tem R$1,2 tri -16% do PIB), isso é questão jurídica/contábil. Retirando as regras fiscais do caminho usa-se a conta única. Retirando a proibição de o BC financiar o TN, não há limites para o gasto público.
Pedro Rossi é professor do IE-Unicamp, pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica da Unicamp e coordenador do Conselho Editorial do Brasil Debate.
Fonte: publicado em Carta Capital