Famílias se reúnem para denunciar os desmandos da Renova, exigir imediata contratação das assessorias técnicas independentes e motivar as lutas na data dos 3 anos do crime
A quase 3 anos do maior crime socioambiental da história brasileira, os atingidos e atingidas pela lama da Samarco (Vale e BHP Billiton) continuam o esforço de fortalecer a organização popular em um ambiente de negligência, desrespeito e negação de direitos.
A Fundação Renova, braço político e publicitário das mineradoras, atua de forma autoritária para dispersar e desorganizar as comunidades transformando o direito dos atingidos em mercadoria, sem apresentar soluções de longo prazo a partir da real vontade dos atingidos.
Apesar de anunciar que já foram gastos mais de R$4 bilhões no processo de reparação, este valor não tem representado o real atendimento das demandas da população atingida. Na região do médio rio Doce, entre Ipatinga e Aimorés, a realidade vivida por milhares de famílias é de uma grandiosa indignação contra a forma de atuação da Renova. A resposta tem sido o esforço de reunir a população, discutir informações seguras e de confiança e construir força popular organizada para garantir o respeito aos direitos.
Entre as iniciativas realizadas, estão reuniões e assembléias que visam informar a população e envolvê-la no processo de escolha das Assessorias Técnicas independentes, processo que está sob responsabilidade do Fundo Brasil de Direitos Humanos (FBDH).
No dia 25 de julho, mais de 2.500 atingidos se reuniram em Aimorés para uma assembléia organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em parceria com associações locais de pescadores. Foi uma grande oportunidade para os atingidos e atingidas denunciarem a negação dos direitos, apresentarem sua pauta de reivindicações e ouvir orientações para o seu o processo de organização.
Estavam presentes o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público Estadual (MPE), por meio da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Social (CIMUS), a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e o Fundo Brasil de Direitos Humanos.
No dia seguinte, pela manhã, estes mesmos convidados estiveram na cidade de Itueta onde ouviram dúvidas e anseios dos atingidos, especialmente da Ocupação Condomínio Itueta, onde também lutam pelo direito à moradia. À noite, a reunião foi em Conselheiro Pena, onde cerca de 200 atingidos entre pescadores, carroceiros, areeiros, produtores rurais, tecelãos, entre outros, manifestaram sua indignação e cobraram ações para o rápido andamento das Assessorias Técnicas independentes.
“Foi muito importante este momento. Nossa cidade está muito carente de informações. A Fundação Renova atua desinformando, desorganizando, mentindo e negando direitos e estas assembléias são essenciais, inclusive no processo das assessorias. Depois daqueles encontros, já realizamos outras reuniões e estamos avançando na organização das comissões de atingidos na região”, comenta Emerson Madeira, pescador de Aimorés que até hoje não teve o seu direito reconhecido pelas empresas.
Seguindo o esforço de reunir, informar e organizar os atingidos, o MAB realiza dezenas de reuniões menores nas comunidades. As pautas se repetem e os danos na vida das famílias se multiplicam com a imposição de regras absurdas para o acesso ao direito como o critério injusto e sem fundamento do LMEO (Linha Media de Enchentes Ordinárias), que para indenizar prioriza quem mora a apenas mil metros do rio Doce ou a regra que obriga a casais terem certidão de casamento para serem indenizados.
É o que os atingidos denunciaram nas assembleias que reuniram dia 20 de agosto, no distrito de Baguari, município de Governador Valadares, em torno de 300 atingidos e no dia seguinte, cerca de 400 atingidos em Tumiritinga, em reunião organizada pelo Fórum da Bacia do rio Doce.
Ainda no dia 21 de agosto, cerca de 1700 atingidos e atingidas realizaram assembléia na cidade de Resplendor, também com a presença do MPF, MPE\CIMUS, Fundação Getúlio Vargas e Fundo Brasil de Direitos Humanos.
“Aqui em Resplendor, além de todos estes temas fundamentais como indenização justa, ainda temos enfrentado o dilema da água que agora querem tratar direto do rio Doce. Nós não aceitamos, já enviamos nossa posição para todos os órgãos e precisamos da assessoria independente para discutir isto com mais segurança”, afirma Graça Cruz, militante do MAB e integrante da Comissão dos Atingidos e Atingidas de Resplendor.
No meio da tarde do dia 22 de agosto, o mesmo grupo de convidados se reuniu para ouvir os atingidos de Naque e Periquito em uma assembleia que reuniu cerca de 200 pessoas. Valeriana Gomes denunciou que após dezoito anos de união, a Fundação Renova quer que ela apresente uma certidão de casamento para ser indenizada. “Isto é um absurdo! Querem me obrigar a casar para receber o prejuízo imenso que eu tive na minha ilha dentro do rio Doce?”, questionou a atingida, que trabalha com búfalos e não foi indenizada. Ela integra a Comissão dos Atingidos e Atingidas de Naque.
O trabalho do MAB continua em toda esta região atingida mobilizando as comunidades e integrando as Comissões de Atingidos e Atingidas nos municípios. Para Guilherme Camponez, atingido em Governador Valadares e integrante da coordenação do Movimento, o desafio, agora, é garantir as assessorias técnicas. “Este é um passo muito importante: ter as entidades escolhidas pelas comunidades atuando o mais rapidamente possível. A Renova tem atuado negando direitos e a assessoria é um grande instrumento para enfrentarmos isto”, comenta.
Todos este esforço de mobilização também visa organizar atividades nos 3 anos de tragédia que se completa em 5 de novembro de 2018. Para Guilherme, esta é uma data que deve ser sempre lembrada em memória dos mortos e como marco de luta pelos direitos. “O MAB e suas parcerias estão organizando diversas iniciativas para esta data em toda bacia. Vamos transformar novembro em um mês de luta pelos direitos dos atingidos, por dignidade e respeito. Sem luta, não alcançaremos isto”, conclui.
Fonte: Mabnacional.org